CAPITULO 6
Distribuição do conhecimento escolar e
reprodução social
As teorias
sobre as relações entre a escola e os processos de reprodução cultural e social
sugerem que, a despeito da uniformidade estrutural dos sistemas escolares, o
que existe, na realidade, é um processamento diferenciado dos alunos
pertencentes a classes sociais diferentes. De acordo com essas teorias (Bowles
& Gin tis, 1976, por exemplo), esse processamento diferenciado está
relacionado a processos mais amplos de reprodução social que ajudam a perpetuar
a estrutura econômica e social existente.
(Crianças e
jovens de classes sociais diferentes são diferenciadamente processados nas
escolas e esse tratamento diferenciado, por sua vez, predispõe-nos a ocupar
posições correspondentes na estrutura ocupacional.
De forma
esquemática, às classes subordinadas ensinam-se, através dos currículos
manifesto e oculto da escola, as “virtudes” do conformismo e da submissão a
ordens diretas, externamente emitidas. Em contraste, as crianças e jovens das
classes dominantes são socializados nas escolas para r serem independentes,
autônomos e para internalizarem o controle. Além disso, enquanto estes recebem
um conteúdo cognitivo de status mais elevado, àqueles se ensina um conhecimento
de natureza “prática”, quando muito.
O estudo
descrito neste capítulo foi concebido dentro do amplo marco teórico fornecido
por essa literatura. Ele foi planejado, entretanto, também, para tentar
preencher algumas das lacunas existentes. Essencialmente o que está faltando nessas
“grandes” teorias (Althusser, 1970; Bourdieu/ Passeron, 1970, entre outros) é
uma descrição e uma compreensão dos processos específicos no interior das
escolas que fazem a mediação entre elementos da estrutura social mais ampla e
os outros resultados da escolarização supostamente conectados com processos de
reprodução social. O estudo buscou também verificar algumas suposições dessas
teorias.
Esta
investigação, por outro lado, foi metodologicamente inspirada e guiada por um
grupo de pesquisadores que têm tentado estabelecer as conexões entre os
processos de transmissão de conhecimento nas escolas e a estrutura social mais
ampla. Começando com alguns estudos realizados no âmbito do marco estabelecido
pela “nova” sociologia da educação (Keddie, 1971, por exemplo), essa abordagem
tem sido reforçada recentemente por estudos tais como os de Anyon (1981),
Connell et alii (1982) e Popkewitz et alii (1982). Whitty (1985) faz um bom
balanço das questões teóricas, analíticas e metodológicas que têm preocupado os
investigadores dessa abordagem e fornece um útil sumário das pesquisas e dos
estudos nessa área.
A questão
central que orientou esse estudo pode ser formulada da seguinte forma: Que
pedagogias diferentes são distribuídas em escolas freqüentadas por classes
sociais diferentes? Mais especificamente: Que padrões diferentes de trabalho
escolar e de controle predominam nas salas de aula de escolas freqüentadas por
crianças de diferentes classes sociais? Qual é a na tu reza e a lógica do
pensamento pedagógico dos professores que dá coerência e suporte ideológico a
esses diferentes padrões? Quais são as suposições e os significados por detrás
dos credos pedagógicos visíveis e dos credos pedagógicos ocultos?
Em um nível
intermediário de análise, o estudo buscou responder à questão das origens das
diferentes pedagogias em uso nas escolas estudadas. Ele procurou localizar
aqueles fatores situacionais, organizacionais e estruturais que pudessem
explicar a distribuição desigual de pedagogia.
Em um nível
mais teórico, o estudo tentou responder às seguintes questões: Que tipo de
implicações podem ser extraídas de seus resultados para a compreensão das
relações entre a escola e o processo de reprodução cultural e social? Quais são
as conseqüências da distribuição desigual de pedagogia entre as diferentes
classes sociais, se é que ela existe, para os processos de reprodução cultural
e social?
Para o
propósito deste estudo, selecionei três escolas em Porto Alegre, capital do
Estado do Rio Grande do Sul. Duas das escolas selecionadas são escolas públicas
estaduais; a terceira escola é uma escola administrada por uma fundação
particular formada por pais de alunos. Uma das escolas públicas, que será
chamada de Escola A, é freqüentada predominantemente por filhos de pais de renda
média e médio-alta; a outra escola pública, aqui chamada de Escola B, é
freqüentada exclusivamente por filhos de moradores da vila periférica popular
onde a escola está situada. A escola particular, aqui chamada de Escola C, é
freqüentada por filhos de pais de renda médio-alta e alta.
Duas
classes, uma de terceira e uma de quinta série, em cada uma das escolas, foram
intensamente observadas. Nas terceiras séries uma única professora era responsável
por todas as disciplinas. Nas quintas séries cada disciplina era ensinada por
uma professora específica. Observei somente as professoras de Português,
Matemática, Ciências, História e Geografia. No total, gastei 147 horas
observando as seis classes.
Durante o
período de observação, entrevistei cada uma das professoras cujas classes eu
observava. Procurei saber das professoras a respeito de suas percepções sobre o
enfoque pedagógico usado na escola, sobre as visões das situações familiares
dos alunos e sobre suas perspectivas a respeito do currículo, do controle de
disciplina, rriétodas de ensino e avaliação.
Nas seções
que se seguem apresentarei um sumário e uma análise dos padrões de trabalho
escolar e de controle de comportamento encontrados nestas escolas. As
perspectivas das professoras são t3mbém sumariadas e analisadas e suas relações
com aqueles padrões serão examinadas. Na parte final do capítulo esses
resultados serão interpretados tendo em vista a literatura pertinente.
Padrões
de pedagogia nas três escolas
Os padrões dominantes de trabalho escolar e de
controle nessas escolas apresentam certas características diferenciadoras,
sugerindo que, a despeito de uma mesma aparência, os alunos de cada uma delas
experimentam, na verdade, tipos diferentes de escolarização. A adoção do mesmo
formato escolar externo (classe e séries, aulas e professores, duração do ano
escolar, horário escolar, etc.) oculta o fato de que as experiências
educacionais oferecidas às crianças das diferentes classes sociais que frequentavam
essas escolas são de natureza e qualidade distintas.
Os filhos de
pais de renda alta que freqüentam a Escola C por exemplo, experimentam um modo
de ensino e aprendizagem que enfatiza processos de conhecimento ao invés da
mera memorização de partes isoladas de informação. O conteúdo é visto como o resultado
da interação I dos alunos com uma variedade de materiais e experiências, em
oposição a um conteúdo que é simplesmente transmitido peja^-professora ou pelo
I livro-texto. Concede-se nas classes observadas na Escola C uma ampla
oportunidade para a expressão oral e para outras formas de expressão. Essa modalidade pedagógica
predomina amplamente sobre os exercícios mecânicos e solitários. De forma
similar, esse tipo cie exercício é muito menos enfatizado que a solução de
problemas e tarefas abertas.
Nessas classes usa-se uma gama variada de
formas de execução do trabalho escolar e de aquisição do conhecimento. Embora o
uso do diálogo entre professoras e alunos pareça ser levemente favorecido em
relação a outros métodos, as professoras freqüentemente lançam mão de outras
atividades de aprendizagem, tais como excursões, projetos de pesquisa, ioeos,
manipulação de materiais concretos e experimentos.
O processo
de criação, recriação e descoberta de conceitos e princípios é enfatizado em
detrimento do mero armazenamento de fatos e informação. Ua mesma forma, a
experimentação e a investigação, a observação e a extração de conclusões e a
organização e o relato de resultados são usados com mais freqüência que os
exercícios de preenchimento relativos a questões factuais e fragmentadas, do
tipo comumente encontrado nos livros didáticos e cadernos de exercício. Os
propósitos e procedimentos de cada atividade são integralmente apresentados às
crianças e elas têm ampla oportunidade de discuti-los.
A própria natureza do padrão de trabalho
escolar predominante nas classes observadas garantia que as crianças obtivessem
informação imediata e freqüente sobre o resultado de seus trabalhos. Uma vez
que elas freqüentemente tinham que relatar os trabalhos na frente da turma ou
fazer alguma outra forma de apresentação pública dos resultados dos projetos I
que estavam realizando, ou tinham que dialogar com a professora, a oportunidade para ofeedback estava de certa
forma embutida nas próprias 9 atividades que elas tinham que executar. Nas
ocasiões em que um tipo mais convencional de trabalho escolar era exigido, a
oportunidade para que os I alunos corrigissem suas respostas era prontamente
fornecida.
As
estratégias e práticas usadas pelas professoras nas classes observa-i das na
Escola C para controlar o comportamento dos alunos eram congru-I entes com os
padrões dominantes de trabalho escolar nesta escola. Embora j exemplos de
tentativas das professoras em obter obediência através de modos imperativos de
controle não estivessem ausentes, a atitude predominante entre elas era a de
usar a negociação e o raciocínio para assegurar a ordem e o controle. Com muita
freqüencia, as professoras tendiam a apresentar razões e justificações quando
ocorriam casos de ruptura da ordem, para trazer os alunos de volta à conduta
desejada. Uma estratégia freqüentemente usada era a de fazer as próprias
crianças enunciarem as regras e as normas a serem seguidas na classe e a dar
razões para usá-las. Havia uma suposição implícita de que a responsabilidade e
o controle ; interno resultariam dessa prática. Outra prática resultante dessa
crença era ) a de deixar as crianças discutirem as conseqüências de certos atos
de “mau comportamento”.
Na Escola B
havia um padrão completamente diferente de controle e de traBcrtiiu egcolar.
Nessa escola havia muito pouca interação oral entre professoras e alunos em
relação a questões de conhecimento. O tipo dominante de tarefa escolar era
constituído de trabalho solitário em livros-texto, livros de exercício, cadernos
e folhas mimeografadas. Os alunos eram freqüentemente solicitados a fazerem
exercícios do tipo “preenchimento” que exigiam respostas curtas a questões
factuais. Esse tipo de tarefa era precedido por uma introdução curta e
verbalmente econômica de algum, topfca~novg pela professora. EirTgePal, ás
crianças faziam seus exercícios sem nenhum tipo de monitoramento e sem
assistência individual. A interação verbal entre professoras e alunos
limitava-se a questões de procedimento, controle e econômicas seqüências
pergunta-resposta.
Havia poucas
ocasiões para feedback. Em geral, as respostas das crianças aos exercícios
(mecânicos) permaneciam sem verificação. Havia uma disfunção entre o que estava
sendo ensinado e aquilo que supostamente estava sendo aprendido.
O uso
generalizado de exercícios solitários excluía o uso de outros modos de ensino e
outros tipos de atividade. Observava-se uma impressionante monotonia no tipo de
trabalho escolar usado nessas classes. Além de crianças trabalhando individualmente
em suas carteiras, curtíssimas apresentações de novos tópicos pela professora e
diálogos ocasionais entre a professora e os alunos, pouco mais que isso, em
termos de trabalho escolar, podia ser observado aí.
As
professoras das classes estudadas na Escola B tinham poucos problemas de
controle, uma vez que as crianças, em geral, se mostravam dispostas à
aquiescência. A tarefa das professoras na manutenção da ordem era facilitada
pelo padrão dominante de trabalho escolar. Manter as crianças ocupadas em tarefas
individuais fazia parte da estratégia de controle. Quando alguma ruptura
ocorria, modos imperativos de controle, com o uso de comandos para que as
crianças em questão a ela retornassem, constih ííam a forma predominante de
controle verbal. O domínio abrangido por esses comandos estava limitado a umas
poucas áreas de comportamento e atitudes, na maior parte relacionadas a normas
de postura e silêncio. Podia-se observar uma tendência a considerar essas
normas como valores intrínsecos, isto é, havia pouco esforço em conectar a
observância dessas regras preocupações morais e afetivas mais amplas.
Na Escola A, os padrões de trabalho escolar
predominantes nas classes estudâtia&-eram similares, em muitos aspectos,
aos encontrados na Escola B. A mesma ênfase no uso de livros-texto e livros de
exercício podia ser observada aqui. Crianças trabalhando individualmente em
seus cadernos e livros de exercícios, respondendo a questões factuais e
praticando exercícios mecânicos era o cenário predominante nessas classes. A
ausência de modos de ensino que não fossem essas atividades solitárias e
apresentações econômicas de tópicos pela professora era também uma
característica notável do padrão encontrado.
Embora
houvesse alguma interação verbal entre professoras e alunos, ela era bastante
limitada em sua abrangência e em seu conteúdo. Quando não estavam restritas a
trocas verbais a respeito de questões de procedimento ou controle, essas
interações raramente envolviam discussões mais prolongadas sobre questões
abertas ou ambígüas. Mais freqüentemennte, elas se constituíam de seqüências
curtas de pergunta-e-resposta a respeito de segmentos de informação, nas quais,
em geral, os alunos não tinham a iniciativa.
O que
distinguia essas classes daquelas observadas na Escola B, entretanto, eram a
urgência e diligência exigidas das crianças na realização das tarefas
atribuídas. Os conteúdos eram transmitidos e as tarefas eram passadas e
cobradas num ritmo extremamente rápido, uma característica que estava ausente
na Escola B. Em geral, as professoras pareciam estar altamente preocupadas com
a transmissão eficiente da matéria, embora numa forma convencional e desprovida
de imaginação.
Uma
característica distintiva adicional do padrão de trabalho escolar encontrado
nessas classes, relacionado à anterior, era a preocupação com a correção dos
exercícios. Usualmente, as respostas das crianças aos exercícios eram
prontamente verificadas e corrigidas de uma forma ou outra, uma preocupação que
raramente existia na Escola B.
Em contraste
com as crianças observadas na Escola B, as crianças na Escola A apresentavam
freqüentes problemas de controle para as professoras. Esses problemas eram
manejados de forma diferente pelas diferentes professoras. Mas o padrão mais
comumente encontrado era aquele no qual as professoras usavam modos imperativos
de controle verbal para obter a aquiescência às normas de conduta em sala de
aula.
Manter as
crianças ocupadas era também aqui visto por algumas professoras como central à
sua estratégia de controle, mas ficava óbvio, observando-se o comportamento das
crianças, que isto não era suficiente para manter a ordem em classe. Nas
ocasiões em que havia ruptura das normas, o que ocorria com uma certa
freqüência, a emissão de ordens diretas às crianças envolvidas para que
interrompessem a conduta “perturbadora” era a estratégia mais comumente usada.
Somente de forma excepcional as professoras recorriam ao raciocínio ou à
exortação para restaurar a ordem em classe.
As perspectivas das professoras: Os temas
dominantes e a lógica de seu discurso pedagógico
Uma análise
das entrevistas com as professoras demonstra que o discurso educacional era
diferente nas três escolas estudadas.
A elaboração
ideológica de suas práticas era guiada por lógicas diferentes, enfatizava
diferentes temas e dava significados diferentes às categorias escolares.
A diferença
mais óbvia e saliente entre os discursos ideológicos predominantes nas três
escolas era dada pela existência de um credo educacional comum e explícito na
Escola C e pela ausência concomitante de um ideário desse tipo nas outras duas
escolas. Enquanto as professoras e os outros membros da equipe da Escola C
tinham a seu dispor um conjunto explícito de valores, conceitos e princípios
aos quais podiam recorrer para dar coerência, propósito e senso de segurança a
suas ações educacionais, as professoras e as outras pessoas entrevistadas da
equipe das outras duas escolas eram guiadas basicamente por um entendimento
consensual implícito a respeito dos objetivos e da natureza do ensino que
deveriam oferecer. Esse entendimento parecia estar baseado no senso comum, nas
visões idiossincrátias de cada uma sobre escola e educação e nas pressuposições
partilhadas e implícitas sobre o tipo de educação que melhor convinha às
características de classe das crianças sob sua responsabilidade.
O credo
educacional explícito adotado pela equipe da Escola C não pode ser analisado
sem alguma compreensão de suas origens. A escola foi criada como uma escola
“ativa”, ideologicamente baseada na doutrina humanística da Igreja Católica
pós-Concílio Vaticano II e em certos princípios do pensamento educacional da
Escola Nova. Ela foi fundada por um grupo de educadores que pareciam estar
insatisfeitos tanto com a qualidade do ensino nas escolas públicas, quanto com
os métodos convencionais de ensino que predominavam nas escolas particulares.
As raízes do
credo pedagógico adotado na Escola C são facilmente identificáveis. Certos de
seus princípios têm estado presentes no pensamento educacional brasileiro desde
os anos 30, nas idéias e na obra de educadores brasileiros filiados à Escola
Nova (Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo e outros), muito influenciados por
John Dewey. A maior parte dos elementos da pedagogia da escola, entretanto,
pode ser mais imediatamente identificada com certos princípios educacionais
derivados da psicologia desenvolvimentista de pesquisadores tais como Piaget.
O pensamento
pedagógico predominante na Escola C, entretanto, tem outras fontes e origens,
cuja localização pode ser apenas adivinhada. Um tema insistente de seu discurso
educacional - a crença na eficácia de suas práticas educacionais para tornar os
alunos agentes de transformação social, por exemplo - pode ter sua origem no
compromisso ideológico da escola com a doutrina social da Igreja Católica tal
como expressa em algumas encíclicas papais, em que noções de solidariedade e
justiça social são tíàstante enfatizadas.
A percepção que têm as professoras a respeito da
“riqueza” do amoiente de seus alunos certamente tem um papel, senão na gênese,
ao menos na manutenção de tal pedagogia. Elas tendem a vê-lo como um ambiente
no qual a disponibilidade de recursos educativos e a adoção de práticas
liberais de tratar as crianças tornariam o uso de métodos pedagógicos
convencionais altamente problemático. Os métodos tradicionais de ensino, com
sua ênfase na aprendizagem mecânica e em modos imperativos de controle,
certamente iriam se chocar com os tipos de valores e disposições nos quais as
crianças são socializadas na família.
Em
contraste, exceto por alguns objetivos gerais e vagos, a ausência de um
conjunto explicitamente partilhado de princípios pedagógicos é a característica
mais saliente do pensamento e das visões das professoras da Escola B. Podemos,
não obstante, identificar alguns temas e significados comuns no discurso
educacional dessas professoras.
Antes de
tudo, as visões dessas profesoras estavam baseadas numa teoria implícita que
atribuía a maioria dos problemas que elas enfrentavam no seu cotidiano às
característias de classe das crianças e suas famílias. Num contraste nítido com
a atitude predominante na Escola C, onde a singularidade e as necessidades
individuais de cada criança eram enfatizadas, aqui os problemas e as
características das crianças como um coletivo eram o foco das preocupações das
professoras. Havia a construção de uma imagem de um tipo social, cujas
características eram mais abrangentes e salientes que as necessidades
individuais tão cultivadas pelas professoras das crianças “bem postas na vida”.
A mesma teoria que forja essa imagem das crianças como portadoras de uma
constelação indistingüível de problemas (má conduta, pouca motivação, pouco
rendimento), tende a atribuir a causa disso às supostas condições de
deterioração material emoral da vida da família dessas crianças - habitação
precária, insalubridade, violência, famílias separadas, etc.
Essa
explicação é provavelmente uma explicação realista no que concerne a vários de
seus elementos e está baseada na experiência de primeira mão dessas
professoras. O que existe de problemático com essa visão, entretanto, é,
primeiro, o equacionamento implícito de deficiências materiais com deficiências
morais e culturais. Uma falta real de recursos
materiais
tende a ser equacionada com uma falta de valores morais, de “bons hábitos”, de
afeto, de motivação e habilidades lingüísticas. Embora algumas dessas
suposições possam ser verdadeiras para casos individuais, existe aí uma
inclinação a atribuir um rótulo de déficit cultural auma classe inteira, uma
implicação que é problemática por diversas razões.
O segundo
problema com esta visão é que ela pára aí. Afirmar que as famílias dessas
crianças são “carentes” fornece toda a explicação necessária para todos os
problemas que as famílias, e por implicação, as professoras enfrentam. Há uma
aceitação implícita do estado existente de coisas tais como são, com base num
raciocínio circular: as crianças e suas famílias apresentam essas “más”
características porque elas são “carentes” e elas são “carentes” porque elas
têm essas “más” características. As circunstâncias sociais e econômicas que
estão na raiz desses déficits materiais (que são, sem dúvida, responsáveis por
algumas injúrias afetivas) permanecem sem exame no pensamento dessas
professoras. É um paradoxo que, enquanto os déficits materiais acarretam
julgamentos morais negativos para essas professoras, elas são incapazes de ver
algumas dessas características culturais distintas dessas pessoas como
respostas realistas e adaptativas a problemas de sobrevivência econômica.
Finalmente,
a visão negaüva e patológica a respeito do ambiente das crianças tem uma
contraparte nas visões predominantes das professoras a respeito da escola, seu
papel e função. Ao deprimente cenário de condições domésticas deterioradas e
famílias separadas, estas professoras contrapõem um cenário da escola como um
local de abrigo protetor temporário, onde as crianças podem encontrar um
refúgio durante um parte do dia e durante parte de suas vidas, nas quais elas
freqüentam a escola. As professoras parecem consolar-se com o fato de que podem
fornecer alguns momentos felizes, nas, fora disso, miseráveis vidas dessas
crianças.
Mais
importante, entretanto, é a implicação que esta visão patológica de déficit tem
para o tipo de educação que essas professoras pensam deva ser dada a essas
crianças. Como a supervisora pedagógica e a diretora tão insistentemente
afirmaram, a escola deveria adaptar-se à “realidade” dessas crianças. Esse en
tendimento é freqüen temente traduzido no pensamento das professoras num
rebaixamento das expectativas acadêmicas e no inculcamento dessas mesmas
virtudes e va 1 ores moraTsTq ue tànto faltam nos ambientes familiares.
A lógica
desse raciocínio é, em parte, responsável pela definição extremamente estreita
dada por essas professoras a certas categorias escolares tais como currículo,
avaliação, métodos de ensino. Excetuando talvez a professora de Ciências, o
trabalho escolar para essas professoras é adequadamente descrito por uma imagem
fornecida pela professora da terceira série: “Crianças sentadas nas suas
classes com um caderno em suas mãos”. Currículo, avaliação, experiências
educacionais são limitadas a uma gama bastante restrita. Na realidade, a
natureza das experiências educacionais favorecidas por essas professoras é
revelada exatamente pela quase completa ausência de qualquer proposição mais
ampla sobre princípios e conceitos de aprendizagem e ensino. Ironicamente,
apesar da percepção das professoras a respeito da deficiência de recursos culturais
no ambiente familiar dessas crianças, a escola oferece uma gama
correspondentemente limitada de experiências educacionais.
Finalmente,
as visões dessas professoras são formadas tanto pelo futuro que elas imaginam
será o dessas crianças, como pelas circunstâncias presentes de suas vidas. O
fato de que a maioria dessas crianças vai abandonar a escola antes de completar
a oitava série é o outro lado daquela realidade tão freqüentemente mencionada
pela diretora e pelas outras professoras. Como disse uma das orientadoras
educacionais: “Por que sujeitá-los a esses testes vocacionais se nós sabemos
que eles vão vender verduras ou colocar tijolos? Esta é a nossa realidade
social”.
As outras
professoras parecem ter expectativas similarmente baixas a respeito do futuro
dessas crianças. Elas também tendem a aceitar isso, sem questionar, como um
fato natural da vida. Com duas exceções, essas professoras satisfazem-se em
apenas listar suas futuras ocupações como consistindo principalmente de
trabalho manual. Ver suas predições tornarem-se verdadeiras ano após ano
impede-as de sustentar qualquer ilusão a respeito da transformação dessa
situação através da educação. Elas nem mesmo tentam apresentar qualquer
explicação para esses fatos, que elas vêem tão claramente, além de sugerir que
as características de classe das crianças podem ser a causa de seu fracasso.
“Isto acontece por causa da vida de família deles: eles não se interessam por
nada”, diz a professora de geografia.
Podemos
agora examinar os temas e suposições principais do discurso educacional das
professoras e outras pessoas entrevistadas na Escola A. Em alguns aspectos, seu
pensamento educacional está próximo ao das professoras da Escola B. O tipo de
escolarização que elas defendem é definido por omissão. O significado que elas
dão às diferentes categorias escolares (currículo, avaliação, métodos de
ensino) deve ser buscado mais naquilo que é deixado de fora de seu discurso do
que naquilo que é efetivamente dito. Uma vez que elas não professam nenhuma
pedagogia explícita em comum, a escolarização para essas professoras é aquilo
que elas normalmente fazem em suas salas de aula. E isto é tão “natural” e tido
como normal
que, em
geral, elas não sentem a necessidade de destacar aquilo que parce tão “óbvio” e
“natural”.
A percepção
de que um dos principais elementos de seu ofício é transmitir eficientemente o
conteúdo da matéria, tendo em vista o exame vestibular (mesmo que este ainda
esteja bastante distante no horizonte da vida educacional destas crianças),
distingue-as das professoras da Escola B, mas isso não é suficiente para
fazê-las adotar uma definição mais ampla de escola e de pedagogia. Ao
contrário, essa pressão serve apenas para reforçar a aderência a um
entendimento convencional e de senso comum do tipo de escolarização que elas
devem fornecer.
Quando
perguntadas sobre educação, pedagogia, avaliação, essas professoras
freqüentemente referiam-se a expressões e conceitos tais como “distribuição e
seqüência de conteúdos”, “transmissão de conteúdo e matéria”, “avaliação por
objetivos”. Ou então limitavam-se a mencionar e a descrever qual era o
procedimento formal oficial da escola em relação a um determinado elemento
pedagógico. Em suma, seu discurso pedagógico era bastante limitado tanto em
abrangência quanto em conteúdo.
Diferentemente
das professoras da Escola B, as professoras da Escola A têm, em geral, uma
avaliação bastante positiva das crianças e de suas famílias. Elas vêem a
maioria das crianças como vindo de lares onde têm uma variedade de recursos,
que correlacionam com um alto grau de educabilidade e de conhecimento do mundo.
Elas se queixam, entretanto, da existência de crescentes problemas de
disciplina e de falta de motivação, que parecem atribuir a anomalias
familiares, principalmente às tensões causadas por pais separados ou à
negligência de pais demasiadamente ocupados. Compare-se a conotação psicológica
desta visão patológica da família com a conotação moral dada pelas professoras
da Escola B. O julgamento das professoras da Escola A não é feito a partir da
avaliação de uma cultura global, mas constitui-se numa explicação psicológica
para uma “disfunção” bem localizada e específica. Como disse a orientadora
educacional: “Em outras escolas públicas o problema é mais econômico. Aqui é
emocional, é um problema de inversão na hierarquia de valores”.
Finalmente,
essas professoras cultivam uma expectativa bastante alta a respeito do futuro
das crianças, fazendo um cálculo bastante positivo a respeito de suas futuras
vidas educacionias e ocupacionais. Elas calculam que a maioria delas continuará
até o segundo grau e depois até a universidade. É esta expectativa, na minha
opinião, que as faz colocar tanta ênfase na transmissão eficiente da matéria.
Na ausência de qualquer outra diretriz, é, em última instância, essa
expectativa que fornece significado e coerência a suas práticas pedagógicas.
Fontes das diferentes pedagogias
Tendo
mapeado as diferenças entre as pedagogias em funcionamento nas três escolas
tanto em termos de padrões de trabalho escolar e de controle quanto em termos
do pensamento das professoras, podemos agora explorar alguns fatores que podem
explicá-las. Já mencionei algumas das possíveis origens dessas pedagogias. No
que segue tentarei desenvolver isto um pouco mais.
Um dos
fatores envolvidos é a estrutura organizacional do sistema educacional. A
divisão mais importante, no que respeita à classe social, é a divisão entre
escola pública e escola particular. O setor público, servindo predominantemente
à classe trabalhadora, está organizado de uma forma tal que responde
principalmente a uma burocracia educacional distante e centralizada cuja
preocupação principal é com os aspectos formais e ritualísticos da escola mais
do que com questões educacionais substantivas. O setor particular, por outro
lado, que atende às classes médias e altas, embora restringido em alguma medida
por determinações estatais, responde atentamente às demandas feitas pelas
classes às quais ela serve, por modos específicos de pedagogia. Este setor tem
também a opção de adotar diferentes estruturas organizacionais internas.
A estrutura
organizacional da Escola C é uma boa ilustração dessa possibilidade de
diferenciação. Organizacionalmente, a Escola C é um fundação privada,
administrada pelos pais e professores. Seus estatutos foram feitos para
garantir a participação de pais e professores na administração escolar.
“Participação da comunidade” é uma expressão central nas atividades de relações
públicas da escola.
A
participação de pais e professores, entretanto, não é feita sem conflito.
Existe uma tensão constante entre pais e professores a respeito de quem tem a
última palavra sobre a educação das crianças na escola. Um elemento diferente
do profissionalismo docente aparece aqui, um elemento que busca proteger
coletivamente os professores da intromissão dos pais. Os professores estão
sempre prontos a tornar claro, sempre que têm a oportunidade, que a pedagogia é
seu domínio exclusivo. Este processo de reserva de domínio profissional tem sua
correspondência num notável processo de coordenação interna. A escola tem uma
doutrina educacional clara e explícita e está organizada para assegurar que
essa doutrina seja realmente praticada.
As duas
escolas públicas do meu estudo são representativas da organização interna de
muitas escolas públicas brasileiras. Paradoxalmente, embora elas sigam um
modelo burocrático no que concerne aos aspectos
externos da
escolarização (suas operações administrativas são regulamentadas em detalhe),
sua operação pedagógica fica inteiramente ao critério de cada professor,
individualmente.
Excetuando
algumas características comuns, devido à mesma ligação com a burocracia
educacional do Estado, as duas escolas públicas examinadas no meu estudo
diferem em relação a alguns elementos organizacionais. A mais visível dessas
características diferenciadoras é o grau de eficiência e diligência aplicadas
em assuntos administrativos. Enquanto a Escola A está muito preocupada com a
operação dessas atividades externas, na Escola B observa-se um certo clima de
“afrouxamento” em questões de administração e organização. Das filas ordenadas
de alunos antes da entrada nas salas até a distribuição cuidadosa das tarefas
administrativas, da organização extremamente cuidadosa dos arquivos e dos serviços
secretariais até o funcionamento ordenado das aulas, o funcionamento e a
organização externas da Escola A passam uma imagem de ordem e eficiência. Em
contraste, uma troca freqüente de professores e de horários, uma alta taxa de
ausência dos professores e falta de pontualidade, o que freqüentemente encurta
o dia escolar, dão à Escola B um aspecto de irregularidade e de falta de
organização.
Essas duas
escolas públicas partilham, entretanto, uma característica organizacional que é
relevante para a análise de sua pedagogia oculta. Nenhuma das duas apresenta
uma coordenação estreita no que diz respeito às suas atividades pedagógicas.
Além da sua preocupação com aspectos externos das atividades de ensino
(formulários, testes, boletins, por exemplo), as professoras têm como
referência para suas ações pedagógicas apenas suas visões idiossincráticas de
educação, definições de senso comum do trabalho escolar e um conjunto de
expectativas baseadas nas suas percepções da classe social das crianças.
Como mostrei,
as experiências imediatas cotidianas das professoras com as crianças das
diferentes classes sociais moldam de forma diferente seu pensamento pedagógico
e suas práticas escolares. Elas tendem a fornecer soluções diferentes para as
diferentes características situacionais de seu trabalho cotidiano. Apesar das
diferenças individuais entre as professoras, são essas respostas que, em última
instância, formam uma cultura docente específica, no sentido de um repertório
de respostas comuns a problemas comuns. É essa cultura que, em cada escola,
molda a pedagogia invisível específica.
Em resumo,
então, a pedagogia explícita professada pela Escola C é uma resposta direta às
necessidades e interesses de certos setores das classes altas por certos modos
específicos de socialização, os quais são funcionais, (ou percebidos como tais,
para a manutenção de seus privilégios eposições d<j classe. A existência de
escolas oferecendo pedagogias diferentes daquela oferecida na Escola C apenas
mostra que diferentes frações das classes dominantes têm diferentes percepções
a respeito das disposições e habilidades que devem ser desenvolvidas por seus
filhos a fim de confirmar suas posições na estrutura social. É também possível
que, para além das aparências diferentes entre as várias pedagogias sendo
oferecidas às classes dominantes, haja alguma valorizada disposição comum que
esteja sendo fornecida por todas. É muito possível que tal disposição seja uma
certa relação com a linguagem: as crianças das classes dominantes adquirem uma facilidade
na manipulação da linguagem, a qual não está disponível para as crianças das
classes dominadas. Em termos de credenciais (diplomas) educacionais estritas,
entretanto, essa medida comum é o grau de sucesso obtido por essas escolas (e
suas pedagogias) na preparação de seus alunos para o vestibular e, portanto,
para a universidade e, ao fim e ao cabo, para o trabalho mental.
Nos poucos
casos em que uma escola pública primária é freqüentada por crianças das classes
médias e altas, como na Escola A parece que os pais podem influenciar, em
alguma medida, a pedagogia da escola em seu favor. No caso particular da Escola
A, a sua pedagogia invisível é, em parte, resultado da pressão direta dos pais.
A influência da classe social, entretanto, é bastante filtrada através do
efeito de expectativas sociais amplas e difusas sobre o pensamento e a ação das
professoras.
Por outro
lado, a maioria das escolas públicas primárias é freqüentada prioritariamente
por crianças das classes trabalhadoras. A natureza da relação subordinada entre
a classe trabalhadora e as instituições do Estado e seu difícil acesso ao poder
político e a outros recursos impedem-nas de influenciar diretamente o
funcionamento e a organização das escolas freqüentadas por seus filhos. Assim, o
que dá forma à pedagogia invisível real é aquela cultura docente de senso comum
desenvolvida pelas professoras no seu encontro cotidiano com os problemas
surgidos das más condições de vida das crianças sob sua supervisão.
Esses
problemas estão na raiz das perspectivas e das práticas das professoras. Minha
análise do pensamento e das práticas das professoras das classes trabalhadoras
pode ter sugerido que suas visões são imaginárias e frutos de mero preconceito.
Entretanto, mesmo que essas imagens possam estar baseadas num conjunto complexo
de representações e concepções distorcidas, elas têm, não obstante, um
referente real. Os problemas que as professoras têm que enfrentar nos seus
encontros cotidianos resultam de pobreza real e são, de fato, enormes e
complexos. As soluções
individuais
podem variar da benevolência e compaixão à hostilidade e à indiferença. Elas
representam, entretanto, estratégias para lidar, dentro da sala de aula, com
enormes problemas econômicos e sociais, cujas causas essas professoras,
compreensivelmente, talvez não percebam. Vale a pena notar que os professores e
professoras das crianças das classes trabalhadoras constituem uns dos poucos
membros de outras classes a ter contato diário com algumas das disfunções
resultantes da lógica da desordem urbana de um desenvolvimento capitalista
dependente.
Os problemas
sociais aos quais as práticas e as elaborações ideológicas das professoras da
Escola B são respostas educacionais não são, obviamente, específicos do entorno
habitacional daquela escola. Eles são um exemplo não apenas da configuração
inteira de desigualdades e disfunções do desenvolvimento urbano da área
metropolitana de Porto Alegre, mas de muitas outras áreas metropolitanas e
urbanas do Brasil.
Pedagogia e reprodução social
É hora de
reunir os elementos principais de meu estudo e relacioná-los ao quadro teórico
da reprodução cultural e social. O que eu apresentei até agora pode ser assim
resumido: l)As escolas examinadas no meu estudo fornecem de fato diferentes
modos pedagógicos. 2)Essas diferentes peda-gogias podem ser atribuídas, entre
outros fatores, às características de classe social das crianças que freqüentam
essas escolas. No que segue tentarei relacionar essas constatações a questões
levantadas pela literatura relevante a respeito das relações entre educação e
processos de reprodução social.
As teorias
de reprodução social foram desenvolvidas sobretudo através de deduções ex post
facto. Raramente elas tratam dos processos mediadores pelos quais os arranjos
institucionais existentes que contribuem para a reprodução social foram
originalmente estabelecidos ou pelos quais eles persistem. Elas usualmente
supõem uma classe capitalista e um Estado oniscientes que fazem o sistema
educacional funcionar para servir eficientemente às necessidades do capital.
Embora o
resultado final seja um sistema escolar funcional às necessidades da classe
capitalista, não é assim tão óbvio que esse sistema tenha sido tão
cristalinamente e propositadamente planejado para isso. Nem é verdade que os
planos do Estado para fazer com que a educação funcione a favor das
necessidades da produção efetivem-se tão facilmente como algumas dessas
formulações pressupõem. Ver o funcionamento e a estrutura, a forma e o conteúdo
da escola como reações e respostas diretas e
mecânicas
aos interesses e necessidades do sistema econômico, mediadas embora pela
intervenção do Estado capitalista, é dar uma ênfase exagerada ao papel da
estrutura em moldar a vida social, em detrimento dos muitos processos e fatores
mediadores. Ademais, esse estilo de raciocínio também tende a fornecer uma
visão estática da sociedade, na qual as possibiliddes para a mudança e a
transformação estão ausentes.
É verdade
que tudo aparece como se o resultado final estivesse na intenção de um Estado
sintonizado com os interesses da classe capitalista. Um exame da estrutura da
força de trabalho na área metropolitana de Porto Alegre, por exemplo, mostraria
um ajuste estrutural nítido entre a escola e o trabalho. Por um lado, o sistema
escolar parece estar produzindo um certo número de pessoas com credenciais
superiores e médias de educação para preencher os postos mais altos e os
intermediários do sistema de produção. Por outro lado, a grande massa de jovens
analfabetos, semi-analfabetos e sem qualquer qualificação que é expulsa
precocemente do sistema escolar parece ser um resultado conveniente e funcional
para a maioria dos lugares ocupacionais oferecidos por essa economia
capitalista dependente, na medida em que fornece um grande exército de reserva
de mão-de-obra não qualificada.
Observar
esse ajuste, entretanto, não é o mesmo que explicar os muitos fatores
mediadores que levaram a esse resultado. Tentarei no que segue descrever alguns
desses fatores tais como eles emergem da minha pesquisa.
Como tentei
demonstrar, um dos fatores mais importantes na moldagem da pedagogia efetiva
usada pelas escolas é a forma com que o sistema educacional é organizado. A
existência de uma rede de escolas particulares possibilita que as classes
médias e altas dêem forma ao tipo de escolarização que querem para seus filhos.
Por outro lado, o sistema público que serve predominantemente às classes
trabalhadoras, dada a estrutura existente de poder, tende a fornecer um produto
pedagógico padronizado. Enquanto o produto educacional distribuído às classes
dominantes está talhado para se ajustar à sua percepção do que é bom para suas
crianças, o produto oferecido às classes trabalhadoras é moldado de acordo com
a percepção da escola sobre qual é o seu mandato.
Não é a
existência de um plano pedagógico organizado, elaborado pelo Estado ou qualquer
outra agência, que permite a distribuição diferencial da pedagogia de acordo
com a classe social. Paradoxalmente é exatamente a suposição de que um produto
uniforme, “escolarização", está sendo oferecido a todas as crianças,
independentemente de sua classe social, que permite sua distribuição desigual.
Dada essa
suposição e a estrutura organizacional que descrevi, é uma interação de fatores
no nível da escola que, em última instância, determina a forma e o conteúdo
efetivos da escolarização que é oferecida às diferentes classes sociais. Como
mostrei, a pedagogia efetiva é feita no nível da escola, é produzida pelos
atores que participam das atividades escolares, não obstante estar delimitada
por fatores estruturais.
Assim, no
caso da Escola C, por exemplo, a pedagogia existente é o resultado de uma
interação dos seguintes fatores: 1)A existência de um grupo de profissionais da
educação, professando uma pedagogia elaborada, cuja origem pode ser atribuída
às frações médias da classe dominante (Bernstein, 1977); 2)A autonomia relativa
da escola particular; 3)A demanda feita por uma fração das classes dominantes
por um tipo de escolarização que ela percebe levar a vantagens no setor
econômico; 4)Uma coincidência entre a pedagogia da escola e a da família.
Ao
contrário, a estrutura organizacional das duas escolas públicas examinadas em
meu estudo impõe limitações mais estreitas sobre as respostas locais. Elas são,
não obstante, dentro desses limites, também produzidas nas próprias escolas.
Como vimos, a mesma estrutura organizacional que conduz a uma ausência similar
de uma pedagogia explicitamente professada na Escola B e na Escola A tende a
produzir de fato duas pedagogias diferentes. Os fatores que produzem essas
pedagogias podem ser assim resumidos: l)Uma estrutura organizacional na qual a
preocupação com uma pedagogia explícita está ausente; 2)Uma pressão de parte
dos pais por um resultado específico (dominínio da matéria, na Escola A), ou a
ausência de uma tal pressão (Escola B); 3)A adoção pelas professoras de uma
pedagogia efetiva baseada nas suas percepções dos ambientes familiares das
crianças e do futuro ocupacional esperado.
A distribuição diferencial de pedagogia e a reprodução
das relações sociais de produção
O propósito
principal deste estudo era o de examinar a distribuição diferencial de
pedagogia e os fatores que a poderiam explicar. O outro lado dessa equação, os
efeitos dessa distribuição sobre a reprodução das relações de produção,
permaneceu implícito ao longo do artigo. Um exame explícito desse aspecto deve
agora ser tentado.
A literatura
sobre escola e reprodução social sugere que a contribuição da escola para a
reprodução das relações sociais de produção é efetivada através dos seguintes
efeitos: 1)A escola forma diferencialmente as subjetividades das diferentes
classes sociais, isto é, ela prepara as classes subordinadas para serem
seguidoras passivas de regras e diretivas e as classes dominantes para ativamente
formulá-las e impô-las e, ao mesmo tempo, para, de forma autônoma, controlar o
seu próprio comportamento (Bowlés e Gintis, 1976, por exemplo). 2)A escola
prepara as crianças das classes subordinadas para aceitar passivamente a
interpretação dominante da sociedade, a ideologia dominante, enquanto as
crianças das classes dominadas são preparadas não apenas para aceitar aquela
interpretação, mas também para reproduzi-la ativamente e para impô-la. 3)A
escola distribui uma cultura e um conhecimento dominante, os quais são parte
constitutiva do “habitus” da classe dominante: esta cultura é consistente com o
capital cultural acumulado por aquela classe, enquanto a classe dominada é
excluída dela pelo próprio processo do “habitus” diferencial cultivado no
domínio da família (Bourdieu e Passeron, 1970). 4)A escola transmite diferentes
tipos de conhecimento às diferentes classes: um conhecimento de status alto às
classes dominantes; um conhecimento de baixo status às classes dominadas
(Baudelot e Establet, 1975). 5)No processo de identificação da escola com o
trabalho intelectual, o trabalho manual é definido pela simples exclusão do
conhecimento escolar e em oposição a ele (Poulantzas, 1978).
Esses
constituem efeitos individuais da escolarização, isto é, efeitos que incidem
diretamente sobre características psicológicas dos indivíduos. Dos autores
revisados acima, somente Poulantzas chama a atenção parà os efeitos da escola
como uma instituição. Ele vê a existência da escola e sua separação da prc dução
como sendo central para a reprodução das relações capitalistas de produção, ou
seja, a divisão entre o trabalho mental e manual. Ele distingue entre a
reprodução dos agentes e a reprodução dos lugares. Os efeitos que listei acima
seriam, de acordo com essa distinção, relacionados à reprodução dos agentes.
Para Poulantzas, a escola, por ser separada da produção e ao equacionar seu
resultado com o trabalho intelectual, reforça a divisão entre trabalho mental e
manual, o que legitima as relações políticas e ideológicas de dominação na
esfera econômica.
Na minha
opinião, a ênfase dada pela literatura aos processos sócio-psicológicos de
internalização do controle e à formação das subjetividades apresenta alguns
problemas. Primeiro, esta literatura parte de uma visão psicológica dos
processos de estabelecimento de relações de dominação/ subordinação, através
dos quais as relações com a autoridade e a hierarquia são internalizadas como
disposições e atitudes psicológicas duráveis e permanentes.
Essa parece
ser uma descrição errônea de como as relações de dominação/subordinação são
criadas e mantidas. A imposição de uma certa visão e de uma certa interpretação
do mundo e da sociedade não é nunca um processo tão fácil quanto algumas dessas
perspectivas teóricas querem fazer parecer. Nem é tampouco uma questão
resolvida para sempre, como a noção de internalização parece supor. Os
processos de estabelecimento de relações de dominação/subordinação e de sua
continuidade pode ser melhor pensado como um processo de conflito e negociação
permanentes, no qual nenhum dos lados pode antecipar uma vitória completa e
definitiva. É sempre uma consideração, de parte do lado dominado, de todos os
fatores envolvidos numa dada relação, possíveis ganhos e perdas, que
determinará o estabelecimento e a continuação da relação de dominação, não um
consentimento internalizado, consolidado, da parte do possível dominado.
Outro
problema com uma análise que vê a relação diferencial com as estruturas de
autoridade da escola como fontes de disposição internalizadas diferenciais é a
suposição de queas atitudes desenvolvidas em resposta às ações da escola são
transferíveis para outros locais. Uma objeção que se pode fazer a essa
argumentação é a de que um exame da história da escola mostrará que relações
autoritárias predominaram na escolarização das crianças das classes dominantes.
Não é a relação dos indivíduos de uma classe com uma instituição que fazem com
que suas subjetividades sejam dominantes ou dominadas. E antes a natureza de suas
relações globais com um conjunto de instituições, incluindo principalmente suas
relações com os meios de produção, que determinam sua posição em relações de
dominação/subordinação. A subordinação temporária nas relações de autoridade
frente a uma instituição educacional pode mesmo ser o preço a pagar para
garantir uma posição dominante na esfera econômica.
Por
outrolado, como observei antes, o equilíbrio das relações de poder é sempre
instável e altamente dependente das condições particulares de uma dada
situação. É meu argumento que as relações na escola, por exemplo, são de
natureza bastante diferente das relações no local de trabalho. Não podemos
predizer o resultado das relações no local de trabalho (sejam de conflito e
rebelião ou de aceitação e conformidade) a partir das relações na escola.
Finalmente,
a passividade e a conformidade às normas e aos valores da escola podem ser
apenas uma estratégia conveniente para lidar situaci-onalmente com os elementos
de poder da instituição. O processo de incorporação e integração tem que ser
refeito a cada vez. Como Foucault (1977) observou tão bem, é exatamente por que
uma internalização bem sucedida não pode nunca ser garantida que dispositivos e
estratégias disciplinares são necessários.
É dentro
deste contexto que quero discutir os meus resultados sobre os padrões de
controle nas três escolas estudadas. Como mostrei, modos imperativos de
controle, nos quais a obediência incondicional à autoridade das professoras era
esperada, eram predominantes na Escola B, embora a execução das normas e regras
fosse raramente feita com rigidez excessiva. As crianças eram, como observei,
usualmente cooperativas e obedientes. Podemos interpretar isso como um
treinamento para o obediência e a subordinação? E, no caso de resposta
positiva, podemos perguntar se esse resultado está sendo eficientemente
produzido, contribuindo assim para um aspecto da reprodução das relações
sociais de reprodução. Podemos apenas especular a respeito das respostas a
essas questões.
Os modos de
controle de comportamento são homólogos aos processos envolvidos no papel de
agentes subordinados nas relações de dominação/subordinação que ocorrem em
outros locais. Mas essa homologia é muito limitada. Traçar um paralelo direto e
completo entre o papel que essas crianças de classe trabalhadora exercem nas
relações sociais na escola e opapel que elas exercerão nas relações sociais no
local de trabalho implica uma falta de compreensão da natureza bastante
diferente das relações nesses dois locais. O exercício do controle na sala de
aula e na escola objetiva apenas conservar uma certa aparência de ordem e do
que é comumente entendido como “escola”. Como vimos, na Escola B a pressão
sobre os alunos em termos de rendimento escolar era bastante frouxa. Além
disso, o custo da desobediência é bastante baixo. Por outro lado, a natureza do
controle no local de trabalho é guiada por um objetivo claro e sem ambigüidade
por parte da gerência, ou seja, o de extração damais-valia. Além disso, a
desobediência tem conseqüências imediatas e de longo alcance. Nesse sentido,
então, algumas das professoras da Escola B estavam corretas ao afirmar que
aquelas crianças estavam aproveitando, possivelmente, os únicos momentos
felizes de suas vidas.
Argumento
que os modos de controle predominantes na escola podem ser melhor entendidos
como um reflexo da posição global da classe trabalhadora nas relações sociais
de produção mais que como uma preparação para elas. Embora aqueles modos possam
estar dialeticamente relacionados à rede global de relações sociais vivenciadas
pela classe trabalhadora numa sociedade capitalista, elas são mais um efeito
que uma causa, mais um resultado daquelas relações que sua fonte. Todas as
escolas poderiam mudar hoje para formas mais brandas e abertas de controle e,
outras coisas permanecendo constantes, nada mudaria em termos da reprodução das
relações sociais de produção, como Bernstein (1977) tão corretamente observou.
Por outro
lado, a submissão fácil demonstrada por essas crianças à ordem escolar pode
significar não que elas tenham internalizado disposições subordinadas, mas
apenas que já calcularam (inconscientemente) suas chances contra uma ordem
social adversa. Elas podem ter apenas desenvolvido estratégias convenientes
para lidar da forma mais econômica possível com essa situação, o que pode
incluir uma aceitação temporária das normas da escola.
É o que
acontece na Escola A, que oferece uma perspectiva melhor para compreender o
papel das relações sociais na sala e na escola nos processos de reprodução
social. As relações sociais nas quais essas crianças estão envolvidas são
claramente inconsistentes, tanto com suas relações sociais na família, quanto
com seus lugares futuros prováveis na produção. E, contudo, a maioria delas certamente
será bem sucedida em ocupar postos privilegiados na estrutura ocupacional.
Finalmente,
parece que, no que respeita ao controle, existe uma perfeita homologia entre os
modos de controle predominantes na Escola C e os lugares prováveis daquelas
crianças na estrutura social. Eu argumentaria, entretanto, que isso deve ser
visto mais como uma conseqüência de sua bem sucedida dominação de classe do que
como uma causa dela. Essas crianças estão tendo o benefício desses modos de
controle porque eles são valorizados por uma fração da classe dominante, a qual
foi bem sucedida na “fabricação” de uma pedagogia para acomodá-los.
Há,
entretanto, um aspecto do modo de controle predominante na Escola C que está
relacionado com a reprodução cultural e social. Mas eu argumentaria que isso
tem mais a ver com a aquisição de uma tecnologia que com a moldagem de alguma
característica psicológica associada com posições dominantes. A ênfase em
processos de negociação e raciocínio, elementos centrais dos modos de controle
predominantes na Escola C, envolve principalmente uma preocupação com a
manipulação da linguagem e da auto-expressão com o objetivo de manipular o
comportamento interpessoal. O uso de processos de negociação para resolver
problemas de ordem na sala de aula e na escola deveria ser visto como uma
prática em habilidades lingüísticas, as quais são essenciais para o bom
desempenho nos lugares dominantes na produção. É conhecimento incorporado na
linguagem que está sendo transmitido aqui.
Isto me leva
ao meu argumento central. O que realmente distingue essas escolas, no que
respeita a processos de reprodução social, é sua distribuição diferencial de
conhecimento. Como mostrarei, sob o disfarce de um formato escolar uniforme, o
conhecimento e as habilidades transmitidas nas três escolas são de natureza
bastante diferente.
Primeiramente,
devemos considerar aquela concepção distintiva do conhecimento e das
habilidades, predominante na Escola C. As crianças não estão apenas sendo
eficientemente introduzidas aos Conteúdos de corpos formais de conhecimento
tais como história, matemática e português. Elas estão também aprendendo uma
relação especial com o conhecimento. Elas aprendem não apenas os conhecimentos,
mas os princípios por detrás de sua produção. Ademais, elas são iniciadas num
conjunto de habilidades tais como: facilidade na manipulação da linguagem,
autoconfiança em termos de expressão pessoal e uma relação crítica com o
conhecimento recebido. Essas são habilidades essenciais no desempenho daqueles
papéis na estrutura ocupacional associados com o controle de outros: elaboração
e planejamento (em oposição à execução), o controle do conhecimento existente e
a criação de novo conhecimento.
Naturalmente,
a condição essencial para que todo o potencial incorporado nesse know-how seja
realizado é permanecer no sistema escolar, a fim não apenas de receber mais
quantidade do mesmo produto, mas também de obter a credencial oficial que é o
que, em última instância, vai sancionar aquele know-how adquirido.
As crianças
da Escola A, como vimos, aprendem um conjunto bastante diferente de
significados, habilidades e relações com o conhecimento. A definição
extremamente estreita de escolarização imposta sobre essas crianças certamente
as deixará em desvantagem em relação às crianças da Escola C, por exemplo. Mas
como elas provavelmente vão permanecer no sistema, terão chances adicionais de
compensar essas possíveis desvantagens. Ademais, a própria ecologia oferecida
pelas suas relações globais de classe provavelmente fornecerá aqueles
conhecimentos e habilidades que a Escola C intencionalmente cultiva nos seus
alunos.
Às crianças
da Escola A, de qualquer forma, está sendo ensinado algum conhecimento, embora
de natureza bastante limitada. Através de sua ênfase no domínio eficiente do
conhecimento contido nos livros-texto e na aprendizagem mecânica, aquelas
crianças estão extraindo não apenas algum significado a respeito da importância
do conhecimento escolar, mas também adquirindo alguma informação e algumas
habilidades de estudo, o que pode se mostrar valioso na sua carreira
educacional subseqüente.
Finalmente,
em contraste com as outras duas escolas, as crianças da Escola B não podem
extrair de sua experiência de escolarização mais que o significado de uma
relação subordinada com o conhecimento, uma vez que a elas não se ensina
qualquer coisa que possa ser substancialmente equacionada com conhecimento. E
contudo elas estão aprendendoa aceitar a legitimidade de um conhecimento que
sempre estará em outro lugar.
Uma vez que
os signos exteriores e os rituais do conhecimento escolar estão também
obviamente presentes aqui (professores, salas de aula, quadros-negros,
livros-texto, folhas de exercício), o status legítimo de um conhecimento que
não lhes está sendo oferecido está sendo gradualmente estabelecido.
Na minha
opinião, o elemento mais importante da pedagogia da Escola B, aquele que
implica nas conseqüências mais sérias para processos de reprodução social, é o
fato de que a essas crianças está sendo dado apenas um arremedo de
conhecimento, uma versão do conhecimento escolar do qual toda substância foi
extraída. Se é verdade que todo conhecimento é transformado na sua passagem
para o conhecimento escolar, nós estamos observando aqui o último estágio nesse
movimento em direção à entropia.
Essa
observação coloca em questão algumas interpretações que tendem a atribuir o
baixo rendimento escolar das crianças das classes trabalhadoras a uma
discrepância entre os valores e o conhecimento dominantes e os próprios valores
e recursos da classe trabalhadora. É verdade que os valores e os recursos
culturais dessas crianças são, em geral, desconsiderados pela pedagogia
escolar. O que é oferecido em seu lugar, entretanto, não é conhecimento
dominante, mas uma versão muito diluída e degradada dele.
Enquanto as
crianças da Escola C estão sendo reforçadas nas posições dominantes herdadas,
sobretudo através da aquisição ativa de valorizados recursos culturais, a
criança que está agora freqüentando a Escola B tornar-se-á o futuro trabalhador
manual através da privação desses bens culturais. O processo que está
acontecendo aqui é de socialização por negação mais que por imposição ativa.
Essa privação, juntamente com a privação de credenciais, à qual ela está obviamente
conectada, está na raiz da divisão mental/manual do trabalho, como Poulantzas
(1978) tão corretamente observou. A escola cria o trabalhador manual não tanto
ao ensinar habilidades manuais num sentido positivo, mas, ao invés, ao definir
o manual em oposição à apropriação do conhecimento que caracteriza o trabalho
mental. Essa visão contribui para lançar alguma compreensão sobre a razãopor
que tantos trabalhadores manuais têm pouco ou nenhuma escolarização nas
formações capitalistas dependentes contemporâneas, um fato que as teorias que
enfatizam o papel ideológico da escola, ou mesmo sua contribuição positiva em
distribuir certas habilidades, na formação da força do trabalho, não podem
explicar.
Finalmente,
cabe lembrar que, embora aquelas características e habilidades mais diretamente
associadas com uma dada posição nas relações.
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